sexta-feira, 20 de maio de 2011

Histórias da Ferroviária - Revista Perfil - "Arquivo Secreto Grená - O terror da arbitragem"

O futebol nacional sempre esteve envolvido com dirigentes folclóricos e emblemáticos. O mais lembrado sem dúvida é o Sr.Vicente Matheus do S.C. Corinthians Paulista. Na Ferroviária, o ex-presidente grená  Milton Cardoso talvez seja o personagem mais original, digno de peripécias e célebres episódios. Neste mês de maio a Revista Perfil em sua coluna "Arquivo Secreto Grená" relata alguns de seus momentos. Segue, na integra, o texto da edição de maio de 2011.


"Arquivo Secreto Grená - O terror da arbitragem" 

Os elencos da Ferroviária, ao longo da história, sempre contaram com ótimos chutadores, que por várias vezes estufaram as redes adversárias graças à precisão milimétrica de suas batidas. Entretanto, não foi nenhum deles que protagonizou aquele que viria a ser o chute mais famoso da Fonte Luminosa. O autor da façanha foi Milton Cardoso, que presidiu a Associação Ferroviária de Esportes no período entre 1998 e 2002.

Milton cumpria o ritual de assistir todos os jogos em sua sala no estádio, com a orelha colada no rádio de pilha e a mão tocando sua santinha. Mas no domingo de 15 de julho de 2001, o dirigente acompanhava a partida contra o Barretos, válida pelo Campeonato Paulista da Série B1, quando um nervosismo fora do comum o possuiu, de modo que em certo momento percebeu que estava com a orelha colada na santa e a mão tocando no radinho.

O culpado pela ira foi o árbitro Robério Pereira Pires, que no primeiro tempo do jogo deixou de marcar três pênaltis claros a favor da Locomotiva: dois em cima de Rodrigo Tabata e um em Grafite, o que gerou muitas ofensas vindas da arquibancada.

Todos os torcedores presentes naquela ocasião com certeza se lembram da sequência dessa história, quando Milton invadiu o campo no fim do primeiro tempo e acertou ‘uma bica’ no traseiro do árbitro.

Obviamente a atitude resultou em punição, mas fez efeito no segundo tempo daquele jogo, quando o pânico fez Robério parar de agir contra a Ferrinha, que goleou por 3 a 0. Mesmo com a perda de mandos de campo, a Locomotiva conseguiu o acesso naquela competição.

O que pouca gente sabe é que, por trás desse ato, existe uma história de muito amor e revolta. Logo aos 10 anos de idade, o pequeno Milton Cardoso, filho de uma família de ferroviários, já frequentava o estádio da Fonte na companhia de seu tios, irmãos e amigos. Oscar Sbaglia, Andrelino, Borgonovo, Pestana e Orlando Texaco são alguns dos nomes que integravam a turma de torcedores.

“Eu cresci vendo a Ferroviária ser prejudicada pela arbitragem. Historicamente ela sempre foi roubada!”, relata, indignado.

Por isso, com aquele chute, Milton teve a oportunidade de compensar todos seus momentos de revolta. Ele garante que a atitude foi elogiada por muitos torcedores, que morriam de vontade de fazer aquilo, e fez com que todos os árbitros que viessem à Fonte passassem a ver o time com mais respeito e, a partir daí, a equipe não foi mais tão lesada como era antigamente.

Mas engana-se quem pensa que suas peripécias contra a arbitragem acabam por aí. Uma revelação surpreendente envolve um jogo da Série A-3 de 1999, quando a Ferroviária enfrentou o Jaboticabal em um confronto onde somente a vitória interessava, o que atraiu à Fonte um público de dois mil torcedores naquela noite de quarta-feira.

“Eu havia escutado um buxixo de que o árbitro Edimar Vandete Pereira apitaria o jogo mal-intencionado, com o objetivo de favorecer um outro clube que compunha a chave”, conta o araraquarense.

Mas como o time tinha condições de vencer a partida, Milton não deu atenção para o boato. Pouco antes do início do jogo, porém, uma forte chuva começou a cair sobre a cidade. O campo ficou alagado, sem condições de jogo e, mesmo assim, o juizão deu início ao duelo. A água não deixava a bola rolar e o dirigente, inconformado, desceu até à beira do campo e passou a chamar a atenção de Edimar, chutando as poças e pedindo que ele interrompesse a partida. O dono do apito ignorava o pedido e seguia firme em sua decisão. Raios, trovões e muitos ventos fizeram com que muita gente deixasse as arquibancadas e, mesmo assim, o jogo continuava, sem chances de gols, o que poderia acabar com as pretensões afeanas na competição.

“Ele se mostrou irredutível e eu retornei para a minha sala. E como eu percebi que não iria resolver com papo, tive que tomar outra atitude”, confessa Milton. Assim, ele pediu para dois diretores resolverem o problema de uma forma simples, prática e eficiente: mandou que fossem até a caixa de força do estádio e tirassem um fusível, que media cerca de 40 centímetros e pesava aproximadamente meio quilo. A missão foi cumprida, cortando a energia do local e transformando o cenário em um tremendo ‘breu’.

Como o temporal e os trovões estavam realmente muito intensos na Fonte (que naquele dia deixou de ser luminosa), o árbitro não desconfiou de nada e parou o jogo, que teve sua sequência remarcada para outra data, quando a Ferroviária acabou vencendo por 3 a 2. Não foi uma chuva de gols, mas serviu para frustrar outro árbitro que ousou prejudicar o manto grená dentro de seus domínios.

Carlos André de Souza é chargista e editor de esportes do jornal O Imparcial

Foto: Carlos André de Souza
Créditos: Revista Perfil Social Araraquara - edição n°12 - Maio-2011, p. 50.
Site da revista Perfil: http://www.revistaperfilsocial.com.br

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